O livro tem como proposta mostrar que Gil Vicente, mesmo oferecendo papel de destaque ao sexo feminino, teceu um discurso misógino em torno dele, principalmente do tipo social da alcoviteira. Neste trabalho, adotamos a hipótese inicial de que Gil Vicente se espelhou na personagem Celestina, da trama La Celestina, de Fernando Rojas, publicada por volta de 1499/1500, e, a partir dela, criou derivações desse tipo social, por meio das quais demonstramos a presença do discurso misógino. Para isso, traçamos o perfil de seis alcoviteiras, presentes em farsas diferentes: Genebra Pereira, no Auto das Fadas (1511? 1527?); Branca Gil, em O Velho da Horta (1512); Brísida Vaz, no Auto da Barca do Inferno (1517); a velha Beata, na Comédia de Rubena (1521); Lianor Vaz, em Farsa de Inês Pereira (1523), e Ana Dias, no Juiz da Beira (1525). Pretende-se, assim, demonstrar que essas personagens, risíveis e farsescas, aparentam ser independentes e revolucionárias, porém, na maioria das vezes, acabam julgadas e punidas de alguma forma, como também Celestina o fora, ressaltando o vilipêndio ao sexo feminino, que teve seus primórdios no período antigo e se consolidou no período medieval.